Texto 05 de 11 | Espaço de Acolhimento
O Primeiro Olhar para o Caos
Lá fora, a chuva cai com ritmo constante, espalhando reflexos que dançam na superfície das poças. O som é ao mesmo tempo imprevisível e reconfortante, como um lembrete de que o mundo segue seu curso, mesmo quando tudo parece desordenado.
Tu olhas pela janela, acompanhando o movimento das gotas, como quem busca respostas naquilo que não pode controlar. É estranho como a chuva parece falar contigo, mesmo que tu não saibas o que ela diz.
Eu me aproximo com calma, trazendo uma xícara de chá quente que coloco ao teu lado. “A chuva,” começo, “tem uma lição oculta. Ela não se preocupa com onde vai cair, nem com o que virá depois. Ela simplesmente flui. Mas nós, humanos, insistimos em resistir ao inevitável. Sempre tentando moldar o incontrolável.”
Tu desvias o olhar da janela, fixando-o na xícara. Algo em minhas palavras encontra eco em ti. “Olha para a chuva,” continuo, apontando para o vidro onde as gotas se juntam em pequenos rios. “Ela não tenta controlar seu curso. Mas nós, quando o caos chega, queremos saber tudo: quando vai acabar, quem é o culpado, o que devemos fazer. É essa luta que nos prende ao caos – não o caos em si.”
O Caos Como Espelho
A chuva intensifica seu ritmo, preenchendo o espaço com uma melodia hipnótica. Tu inspiras fundo, tentando acompanhar o som, mas há algo dentro de ti que ainda resiste.
“Não te peço para ignorar o caos,” digo, sentando ao teu lado. “Ele faz parte da vida. É o empurrão que nos tira do conforto, que nos desafia a crescer. Mas o caos não precisa ser teu inimigo. Ele é como a chuva: inevitável, mas passageiro. E, como ela, pode ser observado sem controle.”
Tu me olhas, com uma mistura de ceticismo e curiosidade. É difícil imaginar que algo tão avassalador possa ser recebido com aceitação. “O caos perde sua força quando paramos de lutar contra ele,” explico. “Não porque ele desaparece, mas porque deixamos de alimentá-lo com nossa resistência.”
O outro viajante, sentado próximo, acompanha em silêncio. Há algo no olhar dele que reflete uma compreensão recente, como quem já experimentou a verdade dessas palavras.
O Refúgio em Meio ao Turbilhão
Coloco uma xícara de chá quente nas tuas mãos. “Sente o calor,” digo suavemente. “Às vezes, o simples ato de parar e estar no presente é o suficiente para criar ordem no meio do caos.”
Tu seguras a xícara, permitindo que o calor aqueça mais do que tuas mãos. O outro viajante observa, ainda em silêncio, mas seu semblante carrega algo que começa a se alinhar ao ambiente: calma.
“Sabes,” continuo, “o caos não é teu inimigo. Ele é apenas o reflexo das coisas que tentamos segurar com força demais. Prazos, expectativas, dores do passado… Tudo isso cresce quando insistimos em controlar o que não pode ser controlado. Mas, como a chuva, o caos também pode fluir. Ele só precisa que paremos de resistir.”
O Peso do Controle
Finalmente, o outro viajante fala, sua voz baixa, mas carregada de significado. “Eu passei anos tentando controlar tudo. Cada detalhe, cada problema. Achava que era o único jeito de manter minha vida em ordem. Mas só me afastava do que realmente importava.”
Tu o ouves, e há algo em suas palavras que reflete diretamente em ti. Não precisas dizer nada; teus olhos entregam o entendimento mútuo. Ambos carregaram o mesmo peso – o peso de tentar controlar o incontrolável.
“Foi quando comecei a deixar ir,” ele continua, “que as coisas começaram a fazer sentido. Não porque ficaram perfeitas, mas porque eu parei de lutar contra o que não podia mudar.”
O Momento de Respiração
Eu observo a troca entre vocês, deixando o silêncio preencher a sala por um instante antes de sugerir: “Vamos experimentar algo juntos?” Ambos me olham com curiosidade, como quem não sabe o que esperar.
“A respiração é uma ponte,” explico. “Ela conecta o caos à calma. Quando tudo parece fora de controle, ela nos traz de volta ao presente.”
Guio vocês suavemente:
“Inspira… um, dois, três, quatro… segura… e agora solta. Solta o peso junto com o ar. Mais uma vez. Inspira… segura… e solta.”
Tu segues o ritmo, hesitante no início, mas logo encontras tua própria cadência. O outro viajante faz o mesmo, e juntos, vossas respirações criam uma harmonia silenciosa.
O som da chuva continua, mas agora é apenas um pano de fundo, uma melodia que acompanha a calma que começa a se instalar.
O Refúgio Dentro de Ti
“Sabes,” digo finalmente, “este refúgio não existe para apagar o caos. Ele está aqui para te lembrar de que, mesmo em meio ao turbilhão, há um espaço onde podes descansar. E esse espaço não está apenas aqui. Ele está em ti.”
Tu olhas para mim, com uma mistura de surpresa e aceitação. O outro viajante assente, e suas palavras são simples, mas carregadas de sabedoria: “Passei tanto tempo procurando fora de mim. Mas talvez o que eu procurava estivesse aqui o tempo todo.”
Eu sorrio, como quem já viu essa compreensão antes. “O caos não desaparece,” concluo, “mas também não precisa te engolir. Quando aceitas sua presença, encontras algo mais profundo: tua capacidade de encontrar paz, não apesar do caos, mas dentro dele.”
A Beleza do Presente
A chuva começa a enfraquecer, mas a calma no ambiente permanece. Tu respiras fundo, e naquele instante, percebes que o caos nunca foi o problema. O problema era a luta contra ele.
Agora, no presente, há algo que nunca pode ser tirado de ti: a tua capacidade de encontrar refúgio, mesmo no meio do caos.
E, por enquanto, isso é mais do que suficiente.
Reflexão Final
"Qual é o caos que tentas controlar? Como seria deixar que ele fluísse, como a chuva, sem resistência?"
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