A Conversa com Caio

Capítulo 10 de 26 | Espaço de Partida


Paulo sentia o peso das últimas semanas. Ele começava a se questionar, mas qualquer pensamento que ameaçasse sua ideia de controle era rapidamente abafado. Estava sentado no pátio, fingindo ler um jornal, quando Caio, o jovem artista do cortiço, se aproximou com um sorriso provocador.

— Você tem cara de quem carrega o mundo nas costas — disse Caio, sentando-se ao lado dele.

Paulo bufou, sem levantar os olhos.
— Você acha que tá fácil pra alguém aqui?

Caio riu.
— Não. Mas sabe, a diferença é que você parece estar tentando carregar sozinho. Isso é bem… coisa de homem, né?


A Primeira Provocação

Paulo estreitou os olhos, irritado.
— O que você quer dizer com isso?

— Só tô dizendo que, às vezes, os caras crescem achando que precisam resolver tudo sozinhos, sem pedir ajuda, sem mostrar fraqueza. — Caio apoiou o queixo na mão. — Parece cansativo.

— Você não entenderia. — Paulo gesticulou, tentando encerrar o assunto. — A vida não é tão simples quanto colocar tinta numa tela.

— E você acha que é simples se esconder atrás de uma armadura o tempo todo? — rebateu Caio.

Paulo o encarou, surpreso com a ousadia.


Um Convite Inusitado

Caio não esperou resposta.
— Vem comigo. Quero te mostrar uma coisa.

Antes que Paulo pudesse protestar, Caio já caminhava em direção ao pequeno espaço onde ele mantinha suas telas e tintas. Relutante, Paulo o seguiu, mais para acabar com aquilo do que por curiosidade.

Caio pegou uma tela em branco e um pincel, oferecendo-os a Paulo.
— Pintar não é só sobre arte. É sobre se permitir.

Paulo cruzou os braços, recusando.
— Isso não tem nada a ver comigo.

— Tem tudo a ver com você. — Caio sorriu. — Você vive tentando provar que é forte, mas e se ser forte for justamente o contrário?


A Confissão de Caio

Enquanto preparava as tintas, Caio começou a falar:
— Quando eu era mais novo, também tentei ser forte do jeito que me ensinaram. Engoli choro, briguei quando me chamaram de nomes que eu não queria ouvir… Até que percebi que isso não me fazia feliz.

Paulo ficou em silêncio, absorvendo as palavras.

— Foi só quando aceitei quem eu realmente sou, quando parei de tentar ser “o homem” que esperavam de mim, que me senti livre. — Caio olhou diretamente para Paulo. — E sabe o que eu descobri? Ser homem não é carregar tudo sozinho. É ter coragem de mostrar quem você é de verdade.


Uma Brecha no Orgulho de Paulo

As palavras ecoaram na mente de Paulo. Ele não respondeu, mas, pela primeira vez, não descartou completamente o que ouviu. Quando Caio estendeu o pincel novamente, Paulo pegou com hesitação.

— Só por curiosidade — murmurou, como se justificasse a si mesmo.


Reflexão de Paulo

Mais tarde, enquanto lavava as mãos sujas de tinta, Paulo se pegou pensando nas palavras de Caio. Ele sempre achou que ser homem significava nunca demonstrar fraqueza, mas aquela ideia começava a parecer… limitada.

Caio havia plantado uma semente, e Paulo não sabia se estava pronto para deixá-la crescer.


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