Manjericão com Amaru

Capítulo 16 de 26 | Espaço de Partida


O sol mal havia nascido, e o cortiço ainda estava envolto em uma névoa suave quando Paulo saiu para o pátio. Ele estava começando a criar o hábito de caminhar cedo, como uma forma de clarear a mente. Foi quando avistou Amaru, ajoelhado no pequeno jardim que ele mantinha nos fundos do cortiço.

Amaru, com sua pele bronzeada e olhos tranquilos, estava concentrado enquanto plantava algo na terra. Ele parecia alheio ao mundo ao redor.

— Bom dia — Paulo disse, hesitante, parando a alguns passos de distância.

Amaru ergueu os olhos e sorriu.
— Bom dia. Madrugador, hein?

Paulo deu de ombros.
— Apenas tentando organizar a cabeça. E você?

— Plantando. Quer tentar de novo?

Paulo hesitou por um momento, mas acabou se aproximando e ajoelhando ao lado de Amaru.


Aprendendo a Cuidar da Terra

— O que você está plantando agora? — perguntou Paulo.

— Manjericão. É bom para a cozinha e afasta pragas — respondeu Amaru, enquanto fazia um buraco na terra com as mãos.

Paulo observava cada movimento, sentindo-se um pouco desconfortável com a simplicidade da tarefa.
— Nunca plantei isso antes.

Amaru sorriu.
— A terra ensina. Você só precisa estar disposto a aprender.

Ele entregou uma muda a Paulo e o orientou sobre como plantá-la. Paulo tentou imitar os gestos do amigo, mas acabou derrubando terra demais.

— Calma — disse Amaru, rindo suavemente. — Plante como se estivesse cuidando de algo que ama.


A Paciência do Cultivo

Enquanto continuavam plantando, Amaru falou sobre sua vida. Ele contou como cresceu em uma aldeia indígena, cercado pela floresta, e como aprendera desde cedo que a natureza era uma extensão de si mesmo.

— Quando vim para a cidade, senti que algo em mim havia sido arrancado — ele confessou. — Aqui tudo é tão rápido, tão descartável. Mas a terra… a terra nos lembra que tudo tem seu tempo.

Paulo ouviu em silêncio, absorvendo aquelas palavras. Ele nunca pensara em tempo como algo que pudesse ser respeitado. Para ele, tudo era sobre velocidade, eficiência, resultados imediatos.

— E como você lidou com isso? — perguntou ele.

Amaru olhou para o jardim ao redor.
— Comecei a plantar.


O Valor das Pequenas Coisas

Quando terminaram de plantar as mudas, Amaru levantou-se e limpou as mãos na calça.
— Agora é só esperar. Regar todos os dias, cuidar da terra, e o manjericão vai crescer.

Paulo ficou olhando para as fileiras recém-plantadas. Era tão simples, mas havia algo de profundamente satisfatório naquela visão.

— Você faz isso por quê? — perguntou.

Amaru sorriu, com um ar de sabedoria que Paulo ainda estava longe de compreender.
— Porque plantar é acreditar que o futuro vale a pena.


Reflexões Noturnas

Naquela noite, enquanto Paulo se deitava, as palavras de Amaru ecoavam em sua mente. Ele começou a se perguntar o que estava plantando em sua própria vida. Será que estava cultivando algo que realmente importava?

E pela primeira vez, ele sentiu que, talvez, fosse hora de começar a cuidar do que tinha ao redor – incluindo Gal, mas começando por si mesmo.


Fechamento do Capítulo

Amaru não deu grandes lições ou discursos. Ele apenas mostrou, com suas ações simples, que reconstruir algo exige paciência, cuidado e fé.

Paulo, ainda em sua jornada de aprendizado, começava a entender que não precisava de grandiosidade para criar algo significativo.

Era o começo de um novo cultivo, tanto no jardim quanto em sua alma.


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