Tentativas Frustradas

Capítulo 3 de 26 | Espaço de Partida


Amanheceu com o som do rádio vindo do pátio, uma mistura de notícias e música popular.

Paulo mal registrou o ruído enquanto se preparava para mais um dia de telefonemas e reuniões que, em sua cabeça, eram fundamentais para recuperar sua posição.

Do outro lado do quarto, Gal terminava de organizar as roupas que haviam levado para o cortiço.

Ela parou por um momento, observando Paulo de terno.

Ele parecia fora de lugar naquele ambiente, como uma peça que não se encaixava.

— Vai tentar falar com quem hoje? — perguntou, hesitante.

— Gente que entende o valor de alguém como eu. Não esse lixo que está por aí — respondeu, apontando para a janela com desdém.

Gal não respondeu.

Apenas pegou um caderno e começou a anotar algo que vinha planejando há dias: pequenas ideias para tornar o quarto mais habitável.


Mais Portas Fechadas

No centro da cidade, Paulo enfrentava uma nova rodada de rejeições.

Desta vez, em uma empresa que ele mesmo ajudara a crescer anos atrás.

— Paulo, é bom te ver. Mas, sabe como é, estamos focados em novos talentos, gente com visão moderna — disse o diretor de recursos humanos, com um sorriso que não chegava aos olhos.

A palavra “moderna” parecia carregada de julgamento.

Paulo saiu da reunião sem olhar para trás, com a sensação de que o mundo seguia em frente sem ele.


Uma Tarde no Pátio

De volta ao cortiço, Paulo passou direto pelo pátio.

Ele tentava evitar os olhares das pessoas que conversavam por ali, mas algo chamou sua atenção: um jovem sentado em um canto, rabiscando algo em um caderno.

Paulo franziu a testa. O que alguém poderia estar planejando naquele lugar? Mas, antes que pudesse pensar mais sobre isso, entrou no quarto.

Gal estava sentada na cama, segurando um panfleto. Ela o olhou com cuidado.
— Talvez você devesse tentar algo diferente.

— Diferente como? — ele respondeu, sem esconder o sarcasmo.

— Não sei… quem sabe aceitar que o mundo mudou? Que você pode fazer as coisas de outro jeito?

Ele riu, mas havia algo amargo em seu tom.
— Você fala como se fosse fácil. Como se eu tivesse tempo para recomeçar.

Gal suspirou.

Ela sabia que qualquer sugestão seria recebida com desprezo.

Então, voltou ao que fazia melhor: encontrar pequenas formas de melhorar o ambiente.


O Reflexo no Espelho

Naquela noite, enquanto Gal dormia, Paulo olhou para o pequeno espelho pendurado na parede.

Ele viu um homem de terno amassado, com as marcas de um dia cheio de “nãos” estampadas no rosto.

Ele desviou o olhar.

Não era o reflexo que queria ver. Não era a vida que imaginava para si.


Reflexão Final

Paulo ainda não percebe que sua luta não é apenas contra as portas que se fecham, mas contra a ideia de que o mundo deveria se curvar ao que ele acredita ser seu valor.

Enquanto isso, Gal começa a entender que o problema não está apenas no mundo — mas em como Paulo insiste em enfrentá-lo sozinho.


Tu pode caminhar por onde quiser. Mas se quiseres seguir a trilha como ela foi pensada, aqui, sempre encontrarás o próximo texto e o anterior.

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